Poesias e Poemas para contemplar e se
encontrar no tempo
Deixe-me desvendar um pouco do meu mundo poético com vocês. Aqui, compartilharei as obras que me arrebataram, que me fizeram flutuar na liberdade das palavras e das rimas delicadas. Por meio das escolhas que fiz e da beleza contida nas coisas simples, posso caminhar sem peso algum. Sou grato a grandes mestres da poesia como Cora Carolina, Cecília Meireles, Fernando Pessoa e Olavo Bilac, que me inspiram com suas expressões líricas da vida e de seus pequenos detalhes cotidianos. Com inteligência e sensibilidade, mergulharemos juntos neste universo inebriante da poesia.
Vende-se - (Olavo Bilac)
http://decarlicris.blogspot.com/2012/09/vende-se-olavo-bilac.html
Certa vez, um grande amigo do poeta Olavo Bilac queria muito vender uma propriedade, de fato, um sítio que lhe dava muito trabalho e despesa. Reclamava que era um homem sem sorte, pois as suas propriedades davam-lhe muitas dores de cabeça e não valia a pena conservá-las. Pediu então ao amigo poeta para redigir o anúncio de venda do seu sítio, pois acreditava que, se ele descrevesse a sua propriedade com palavras bonitas, seria muito fácil vendê-la.
E assim Olavo Bilac, que conhecia muito bem o sítio do amigo, redigiu o seguinte texto:
"Vende-se encantadora propriedade onde cantam os pássaros, ao amanhecer, no extenso arvoredo. É cortada por cristalinas e refrescantes águas de um ribeiro. A casa, banhada pelo sol nascente, oferece a sombra tranquila das tardes, na varanda."
Meses depois, o poeta encontrou o seu amigo e perguntou- lhe se tinha vendido a propriedade.
"Nem pensei mais nisso", respondeu ele. "Quando li o anúncio que você escreveu, percebi a maravilha que eu possuía."
Comentário: Na poesia “Vende-se”, Bilac, habilmente em sua escrita poética, liberta os olhos de um grande amigo, que queria muito vender uma propriedade. Algumas vezes, só conseguimos enxergar o que possuímos, “quando pegamos emprestados os olhos alheios”. Quando refletimos pela indução das palavras, e compreendemos o sentido pleno de seu significado, algo brota em nosso interior, nos despertando da escuridão que o ter provoca. Na condição de humanos, cuja essência é natural e origina-se no princípio do ser, quando rebuscamos nossa real condição enquanto ser social, nos permitimos a determinar as ações cotidianas em consonância com o que trazemos de nossa base familiar.
O COLHER do esCOLHER!
(Carlos Coléct)
A Vida é feita de escolhas! Sim, é o que dizemos!
Não há quem disso corra Não há o que nos socorra!
Mas de quem é a escolha?! Minha ou da Vida?!
Eu escolho
Ou Ela por mim escolhe Se vivo ou morro?!
Sei que muito não escolhi Fui apenas levado a seguir Porém
Muito também
Estava sob o meu poder decidir! Portanto
Penso eu
Que esCOLHEMOS
E somos esCOLHIDOS COLHEMOS
E somos COLHIDOS!
Sou
Faço e estou
Ora porque decido
Ora porque fui induzido!
Mas o que quero dizer É que o esCOLHER
É um COLHER
Para um ser e um fazer Ou seja
Uma seleção Uma colheita
Para um propósito e missão Independente do que seja!
Portanto
Se acredito ser o autor da escolha Do caminho e do plano
Cabe à mim o colher
E dar destino ao campo!
No entanto
Se a autoridade da autoria Está sob a Vida
E seus insondáveis caminhos Então, não posso negar
Que estou dentro de um destino Estou sendo COLHIDO
Estou sendo esCOLHIDO!
De qualquer maneira Nesta colheita
Estamos COLHENDO e sendo COLHIDOs EsCOLHENDO e sendo esCOLHIDOs Determinando o propósito
E sendo determinados pelo destino!
Mas de qualquer forma
Prefiro ter em meu pensamento Que não estou ao vento
Estou do lado de dentro De um belo propósito
Que sustenta o meu entendimento!
Comentário: No ditado popular, encontramos uma sabedoria profunda que nos lembra que colhemos exatamente o que plantamos. Ao tomar decisões, é fundamental analisar cuidadosamente o terreno onde iremos semear, como ilustrado na Parábola das Sementes. Se simplesmente lançarmos nossas sementes ao vento, elas podem se espalhar, mas não há garantia de que irão frutificar. Por isso, é crucial que tenhamos o controle absoluto sobre a semente que representa nossa vida. Não devemos encarar esse controle como algo distante, mas sim como o alicerce para um futuro próspero, onde poderemos colher em abundância.
José
E agora, José?
A festa acabou,
a luz apagou,
o povo sumiu,
a noite esfriou,
e agora, José?
e agora, você?
você que é sem nome,
que zomba dos outros,
você que faz versos,
que ama, protesta?
e agora, José?
Está sem mulher,
está sem discurso,
está sem carinho,
já não pode beber,
já não pode fumar,
cuspir já não pode,
a noite esfriou,
o dia não veio,
o bonde não veio,
o riso não veio,
não veio a utopia
e tudo acabou
e tudo fugiu
e tudo mofou,
e agora, José?
E agora, José?
Sua doce palavra,
seu instante de febre,
sua gula e jejum,
sua biblioteca,
sua lavra de ouro,
seu terno de vidro,
sua incoerência,
seu ódio — e agora?
Com a chave na mão
quer abrir a porta,
não existe porta;
quer morrer no mar,
mas o mar secou;
quer ir para Minas,
Minas não há mais.
José, e agora?
Se você gritasse,
se você gemesse,
se você tocasse
a valsa vienense,
se você dormisse,
se você cansasse,
se você morresse...
Mas você não morre,
você é duro, José!
Sozinho no escuro
qual bicho-do-mato,
sem teogonia,
sem parede nua
para se encostar,
sem cavalo preto
que fuja a galope,
você marcha, José!
José, para onde?
Carlos Drummond de Andrade
Comentário: Quantas vezes nos encontrarmos sem rumo e nos perguntamos e agora José? Nesse mundo efervescente de múltiplas verdades, onde impera a indiferença, o hedonismo e o relativismo, como nos posicionarmos para que possamos compreender e sermos compreendidos. Se por um lado, mantivermos inalteradas as nossas tradições e valores, nos tornamos antiquados e intolerantes, se aceitarmos tudo nos tornarmos sem referência, então como agir? Se a nós, foi concedido à graça de termos o conhecimento, como fonte para construção de um mundo melhor! Cabe, como o José de “Drummond”, abrirmos a porta de nossas “mentes”, com a chave da esperança e encontrar internamente o diálogo amoroso e compreensivo, que possibilite a reaproximação entre os valores que trazemos conosco e a contemporaniedade, de maneira que possa haver uma participação mais efetiva e transformadora dos relacionamentos e das responsabilidades coo seres sociais.
FOTO: Sítio Savaris