a movimentada década de 60, um clã italiano vindo de Marau-RS desembarcou trazendo consigo um ardente desejo: estabelecer um Posto de Combustível com a icônica Bandeira ESSO, que impressionava todos com sua gama de serviços.
Para além do simples abastecimento de veículos, o lugar oferecia uma borracharia, serviços de lubrificação, um arsenal de acessórios e peças e uma mecânica de primeira linha. Mas como se isso não fosse o suficiente, inovaram ainda mais ao trazer uma ferraria, liderada por um talentoso cunhado da família dos empreendedores.
Essa magnífica conquista só se tornou possível graças à força de vontade e união exemplar dos três intrépidos irmãos. Eles se dividiam de forma impecável entre atender os clientes e administrar o empreendimento.
E para completar essa saga épica, dois desses valentes se arriscaram ainda mais, deixando sua terra natal no Rio Grande do Sul e desembarcando na encantadora Vila do Povo Feliz, acompanhados de suas amadas esposas. Já o terceiro irmão, não querendo ficar para trás, selou sua união matrimonial com a filha do proeminente proprietário de um dos hotéis mais prestigiados da vila, cujo nome é homenageado pela rua que passa em frente ao CE Barão do Rio Branco.
O sucesso do empreendimento foi evidente desde o início, embora devam ter ocorrido dificuldades, que foram enfrentadas, já que a época tudo caminhava lentamente. A estratégia adotada era manter uma variedade de serviços, uma vez que, caso chovesse no sentido de Marmeleiro, o local se tornava ponto de parada obrigatório.
A estrada no sentido de Marmeleiro (quilômetros 18 e 15) era praticamente intransitável em dias chuvosos, o que obrigava os caminhões que transportavam madeira, suínos, produtos agrícolas e diversas mudanças vindas principalmente do RS e SC a pararem no estabelecimento. Por outro lado, a serra do Tatetos impossibilitava a viagem no sentido de Barracão, tornando a vila Tatetos também um ponto de parada. Em algum momento, compartilharei as belas histórias desses acontecimentos.
Graças às imprevisíveis condições climáticas da região, a estratégia consistia em ganhar a lealdade dos clientes, o que frequentemente resultava em verdadeiras amizades. Afinal, naquela época, os negócios eram selados com um simples aperto de mãos. Os clientes abasteciam seus veículos, realizavam consertos e só pagavam na próxima visita.
Durante essas estadias prolongadas, era comum presenciar partidas de baralho em cima de um balcão antigo, notavelmente desgastado pelo uso. Esse lugar também se tornava o ponto de encontro perfeito para discutir futebol, política e todos os acontecimentos do dia a dia da vila. Poderia ser até comparado ao lendário Repórter Esso, o programa de rádio criado pelo Governo de Getúlio Vargas, transmitido inicialmente pela icônica Rádio Nacional.
Neste mesmo espaço, havia um espaço com bancos de madeira cinzentos acompanhados por uma área de exibição, repleta de pneus e óleos lubrificantes. Ao fundo, deparavamo-nos com um acessório fascinante, onde era possível comprar peças e acessórios inovadores para veículos e bicicletas. Lona de freio, borracha de cardã, rolamentos e adornos deslumbrantes para raios e guidões, além de capas de assentos.
Os escapamentos e molas, por sua vez, encontravam-se alojados discretamente no porão da residência, onde o administrador morava junto com sua habilidosa esposa e seus talentosos filhos. A esposa, uma costureira extraordinária.
E logo ao lado, um poço encantador aguardava ansiosamente por nossa presença, acompanhado por uma bomba manual que nos brindava com inúmeras doses refrescantes de água.
Na parte inferior da moradia, também se situava a borracharia do renomado mestre da borracha, Dário. Por lá, encontrava-se um indivíduo simples, conhecido como Mandú, churrasqueiro em um hotel próximo (em breve, compartilharei a história desse empreendimento), sendo que passava seu tempo livre jogando conversa fora.
Logo à esquerda, se encontrava uma rampa onde ocorria a troca de óleo e a lubrificação de veículos. Além disso, ao fundo, havia os sanitários. Nessa era dominada pela madeira, todas as estruturas do posto eram habilmente construídas com esse material nobre.
É realmente impossível não relembrar das diversas histórias vividas por aqueles que calculavam mal e se viam derrapando na rampa, sendo resgatados pelo esforço hercúleo de macacos hidráulicos e gentis transeuntes que circulavam pelo posto. Ah, que belas memórias desse tempo!
Meus pais eram clientes dessa família, e era comum eu acompanhar meu pai para abastecer os carros, sempre recebendo mimos adorados como pirulitos em uma caixinha, presenteados por um senhor amável. A lembrança daquele senhorzinho, que provocava olhares atentos e admiração enquanto passava com seu imponente MB/tanque, é uma marca indelével em minha mente. Ele vinha de Curitiba e, a cada quinzena, trazia o combustível de Araucária para abastecer os estoques.
A ferraria, localizada nos fundos do Centro administrativo, era comandada por um talentoso senhor que conseguia moldar o ferro como um verdadeiro artista. Com pancadas precisas na bigorna, ele transformava o ferro após aquecê-lo em um equipamento acionado manualmente, e posteriormente por um motor, para garantir a temperatura perfeita e deixar o ferro maleável.
Esse senhor, assim como os outros membros de sua respeitada família, era austero, o que às vezes gerava alguns desconfortos nas relações interpessoais. No entanto, isso fazia parte do convívio social daquela época. Sempre com as chaves penduradas no passador dos shorts que usava, esse homem era muito caprichoso e ostentava o fusca mais bonito da vila. Nos domingos, após o culto, ele era o primeiro a chegar em um bar próximo à igreja para jogar sinuca. Infelizmente, ele nos deixou logo no início da emancipação, mas sua habilidade como ferreiro e sua profunda religiosidade serão sempre lembradas.
Ao longo dos anos, a família foi crescendo e explorando novas oportunidades. Enfrentando um declínio que afetava a todos na vila no final dos anos 70 e início da década de 80, dois dos irmãos decidiram se mudar para Marmeleiro. Lá, eles abriram um Posto de Combustível às margens da BR, no sentido de Pato Branco.
Mais uma vez, seus negócios prosperaram e seus filhos estudaram, hoje ocupando cargos importantes tanto no trabalho quanto na sociedade. Os irmãos, agora idosos, vivem com suas amadas esposas, cercados por netos e bisnetos. Eles finalmente estão aproveitando merecidamente os frutos de seus esforços ao longo de suas jornadas. Certamente, eles sentem saudades da antiga casa onde seus pais moravam. O local agora abriga o Paço Municipal de nosso Município, ainda com madeiras remanescentes daquele período, que sustentam o símbolo mais importante da instalação da cidade. Sem dúvida, eles devem se lembrar das vezes em que saboreavam uvas sob o lindo e bem cuidado parreiral de sua querida mãe.
O precursor remanescente ficou encarregado de manter vivo o legado de sua família na pequena vila. Com determinação, ele contratou uma equipe leal, que o acompanhou até o merecido descanso em suas aposentadorias. Infelizmente, o destino cruelmente interrompeu sua jornada, tirando sua vida e a de sua amada esposa em um terrível acidente.
Esse homem de coração religioso era muito mais do que um simples morador da vila. Ele era um fervoroso ministro da eucaristia, conduzindo as orações dominicais antes dos cultos e mantendo um profundo vínculo com a igreja. Além disso, ele deixou sua marca no cenário esportivo, levando nosso querido Botafogo ao topo como Técnico Campeão no Campeonato Municipal de Palma Sola em 1978. Até hoje, esse feito é reverenciado como um momento histórico inesquecível para a Vila do Povo Feliz. E não podemos deixar de mencionar que esse triunfo também se tornou uma parte destacada da nossa história local, mostrando que grandes conquistas podem brotar até mesmo dos lugares mais humildes.
Hoje, o posto não está mais no mesmo local, encontrando-se às margens da BR., porém, continua sob o comando do filho desse homem, que deu continuidade à história da família. Ele mantém, inclusive, os costumes que fizeram história e que são uma parte importante da identidade dessa família empreendedora. Essa família contribuiu significativamente para o desenvolvimento do esporte, da religiosidade e da cultura "CTG" em nossa localidade.
Na época de grandes mudanças econômicas e com a terraplanagem para construção do Asfalto na BR 280 a todo vapor nos anos 70, um Posto de combustível estrategicamente se posicionou no alto da serra do Tatetos. Com a serra longa e os veículos superaquecendo depois da íngreme subida, era inevitável parar para um refrescante descanso.
E é claro que essa parada rendia ótimas oportunidades de negócio. Esse posto com a bandeira ATLANTIC foi idealizado por uma família pioneira, que era composta em sua maioria por homens de grande rigidez, às vezes até em excesso. Afinal, andar armado era um costume comum naqueles tempos para impor respeito, principalmente como medida preventiva.
Assim como o icônico Posto ESSO, esse empreendimento conquistou sucesso notável. A vila floresceu e mesmo com a competição entre os postos, ambos criaram oportunidades para os membros da família trabalharem e gerando novos empregos para os habitantes locais. A família do Posto Atlantic, permaneceu à frente do negócio até o final dos anos 70, quando decidiram vender tudo e partir para o Mato Grosso em busca de novas possibilidades. Naquela época, a vila enfrentava dificuldades e era necessário garantir a subsistência de uma família numerosa. Hoje, uma relíquia desse clã pode ser encontrada no Cemitério Municipal, na parte antiga à esquerda, onde repousa um filho dessa família em um sepulcro envelhecido, sua morada eterna.
Meus pais também mantiveram um relacionamento comercial com esse posto, mas foi com o novo dono que nossa família conseguiu estabelecer um vínculo quase familiar. Os novos proprietários, vindos da cidade de São Martinho – RS, onde eram agricultores, decidiram mudar de ares e de profissão. Lembro-me do patriarca, um senhor de cabelos brancos e ascendência italiana, e da matriarca, uma senhora de baixa estatura e origem alemã. O clã era composto por três mulheres e dois homens, que auxiliavam o pai nas tarefas do posto. O filho mais velho possuía uma Kombi e algum familiar frequentemente vinha fazer compras no comércio dos meus pais.
Essa família se empenhou em se adaptar à nova atividade, porém, infelizmente, perceberam que para serem felizes teriam que voltar à sua antiga profissão. Com esse desejo em mente, surgiu a possibilidade de venda para uma família de Campo Erê, que já atuava nesse ramo e, além disso, possuía terras, o que facilitou a negociação. Um dos sócios veio administrar o posto e a família que era proprietária do local foi morar em sua área agrícola para se dedicar à produção de soja, milho e gado. Essa propriedade ficava próxima à Fazenda Caldato, um lugar de difícil acesso.
Diante dessa mudança, a filha mais nova, que pretendia estudar, ficaria impossibilitada. Como nossas famílias eram amigas, ela veio morar conosco até concluir seus estudos. Ela se tornou uma irmã para mim e meus irmãos, éramos superamigos. Ela me aconselhava e me ajudava a enxergar o mundo através dos olhos de uma jovem um pouco mais velha. Afinal, na fase da adolescência, a rebeldia é evidente e as descobertas e escolhas nem sempre são ideais.
Guardo com carinho as lembranças das nossas visitas à casa da minha amiga, localizada no interior. Um dos elementos que mais me fascinava era uma mesa dupla, onde as refeições eram servidas. No centro dela, colocavam-se os pratos e, num movimento giratório, permitia-se que cada um se servisse à vontade.
Outra lembrança que me vem à mente é um aniversário dessa mesma amiga. Estava chovendo torrencialmente, o que fez a estrada se transformar numa via lamacenta. Um dos convidados, morador da Vila, foi com sua caminhonete branca C-10 e levou consigo alguns colegas. Naquela época, sempre cabia mais uma pessoa, então o veículo estava lotado. No entanto, durante uma das curvas sinuosas da estrada, a porta se abriu bruscamente e um dos jovens convidados foi jogado para fora. Por sorte, ele só teve um banho de lama, mas o problema foi resolvido com roupas emprestadas. Hoje, de longe, observo essa família que reside em Ivaí-PR. Minha amiga, agora professora como eu, e seu marido, um contador extremamente talentoso, provavelmente estão aposentados, desfrutando da companhia de seus filhos e aguardando a chegada dos netos. Os patriarcas e o irmão mais velho já partiram para a eternidade e, infelizmente, não tenho mais contato com os demais membros da família. Mesmo assim, sinto-me profundamente feliz ao reviver esses tempos em que a inocência prevalecia diante dos desafios da vida.
Após um breve período de administração da família polonesa no Posto Atlantic nos primeiros anos da década de 1980, surgiu uma oportunidade para a família de Putinga, composta por dois cunhados com parentes já estabelecidos na Vila Tatetos. Diante dos obstáculos enfrentados para a agricultura em suas terras no interior, devido à topografia desafiadora, eles decidiram tomar uma decisão corajosa e mudar de rumo, visando proporcionar melhores condições educacionais para seus filhos.
Essas famílias chegaram à Vila, cada uma com seu clã único, repleto de meninas dinâmicas e inteligentes e rapazes audaciosos em busca de crescimento. Apesar da época desfavorável, enfrentaram bravamente as adversidades e perseveraram em seus sonhos. Os filhos estudavam e colaboravam no cuidado do Posto, enquanto os patriarcas se empenhavam na lavoura e na criação de gado.
Entretanto, chegou o momento em que cada um precisava trilhar seu próprio caminho. Um dos proprietários tomou a decisão de se mudar para a cidade de Marmeleiro, proporcionando à suas filhas a oportunidade de estudar na faculdade de Palmas. Curiosamente, uma delas se tornou minha professora de Língua Portuguesa durante o Ensino Médio. Recentemente, ao organizar minhas lembranças, deparei-me com o resumo do livro "O Cabeleira" de Franklin Távora, uma tarefa que essa professora aplicou e corrigiu com maestria.
O patriarca da família e seus filhos do sexo masculino decidiram montar uma oficina especializada em conserto e venda de bicicletas. Infortunadamente, um dos meninos encontrou a morte em um terrível acidente durante o trabalho.
A família que permaneceu na Vila, enfrentou diversos desafios na atividade de venda de combustíveis. Mesmo passando por um incêndio devastador que abalou não apenas a estrutura emocional, mas também a financeira, eles não se deixaram abater. Especialmente o patriarca, um gaúcho/italiano de coração forte e determinado, que sempre esteve presente para impulsionar o negócio.
Esse senhor é uma figura encantadora, dono de uma simpatia sublime. Sua serenidade e bondade são admiráveis. Apaixonado pelas tradições gaúchas, ele já ostentou o título de Patrão do CTG e foi um dos brilhantes mentores da modalidade campeira. Sempre impecavelmente vestido com sua bombacha preta e a marcante camisa verde de manga longa, ele empunhava com maestria o laço em sua mão esquerda, sempre certeiro no chifre do boi campeiro.
Mesmo agora, em seus oitenta anos, ele continua se dedicando ao manejo do gado e conduz sua camionete com uma destreza que só a experiência lhe permite. Seus passeios pela cidade são verdadeiras contemplações.
Os filhos, por sua vez, seguiram caminhos diferentes. Mesmo à distância, eles acompanham orgulhosos as atividades do Posto. Atualmente, o filho mais jovem administra com sucesso o empreendimento. Arrisco dizer que essa família é uma das que mais soube aproveitar a emancipação do Município. No entanto, essa história deve ser contada por outros, pois minha participação termina em 31/12/1992. A partir daí os fatos estão disponíveis em documentos, fotos e vídeos, que podem ser consultados e compilados por quem tiver interesse.
Assim como em qualquer saga, há momentos que nos trazem alegria e tristeza, conquistas e derrotas. As famílias envolvidas nessa narrativa certamente enfrentaram dificuldades e dores profundas, mas com determinação e fé, elas conseguiram superar todos os obstáculos e alcançar uma vitória gloriosa.
Isso nos mostra que o tempo é sempre um grande desafio, pois o que era importante ontem pode não ter a mesma relevância hoje. O futuro, como diz o ditado popular, pertence a Deus. Que as bênçãos divinas continuem iluminando o caminho dessas famílias, permitindo que eles continuem a escrever sua história incrível, já que legado está garantido.
Um Sonhador Caminhando com Francisco - Escritor do blog https://www.caminhandocomfrancisco.com/
Comments