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A viúva do Templo e a viúva da Hungria

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A presente meditação almeja comparar, isto é, aproximar duas mulheres viúvas e pobres de épocas e contextos diferentes. Para isso, seguiremos os elementos do método da leitura popular da Bíblia: TEXTO-PRETEXTO-CONTEXTOO texto iluminador da nossa meditação é do Evangelho de São Marcos.

 

Eis o texto:

 

Sentado frente ao tesouro do templo, Jesus observava como a multidão colocava ali o dinheiro. Muitos ricos colocavam bastante. Chegou, então, uma viúva pobre e colocou duas moedinhas de pouco valor. Então, Jesus chamou os discípulos e disse: “Em verdade vos digo: esta viúva pobre colocou mais do que todos os outros no tesouro.  Todos eles deram do que tinham de sobra, ao passo que ela, de sua pobreza, deu tudo o que tinha para viver” (12, 41-44).

 

A arte da atenção – o ambiente

 

A breve cena, quase parábola em ação, tem seu significado, seu sentido redobrado.  Jesus está sentado observando atentamente a movimentação em torno do Tesouro do Templo. Jesus é sem dúvida o mestre da atenção plena. “Atenção é a forma mais rara e pura de generosidade”, dizia a mística francesa Simone Weil. Nesse estado de atenção o Mestre de Nazaré observa como a multidão lida com o dinheiro. No olhar atento, sereno e perspicaz ele capta a forma como ricos depositavam muito dinheiro no tesouro. A cena prende completamente a sua atenção. É um episódio maravilhoso!

Em meio ao vai e vem da multidão eis que surge uma viúva pobre que tem apenas duas moedinhas de pouco valor. Essas duas moedinhas ela oferta no Tesouro do Templo. Os gestos são semelhantes, porém um abismo de diferença separa os ricos da viúva pobre. Ela doa a própria vida. Os ricos as sobras. Jesus é todo atenção para ela. O olhar dele é capaz de ver a realidade a partir dos valores essenciais do Reino de Deus. A viúva serve de ícone, de imagem do povo privado do necessário e esquecido pelos dirigentes políticos e religiosos.  Jesus observa cada detalhe desta mulher sem nome. É apenas uma mulher, pobre e viúva vítima do sistema machista e dominante. É uma anônima na sociedade. Hoje, diríamos é uma invisível do sistema vigente. Não temos mais informações sobre ela, mas o que temos é o bastante. Essa viúva é como aquela da história do profeta Elias (1 Rs 17), que repartiu com o profeta a última comida que ela tinha para se alimentar como o seu filho. No reino do espírito, a medida não é a quantidade que conta, mas o tamanho da generosidade do coração.  

 

O elogio da viuvez

 

Jesus está encantado, maravilhado com o gesto, com a atitude da viúva. Ele não quer ficar só para si com o que ele acabara de presenciar. Ele chama os seus discípulos/discípulas para partilhar a notável experiência que ele está vivenciando. A sua partilha na verdade é um nobre e belo elogio a viúva pobre. No tempo de Jesus ser viúva não era nada fácil. Era excluída por ser mulher, viúva e pobre. Tripla exclusão. Na sua atenta percepção Jesus viu que os ricos deram o resto, o que estava sobrando.  Ao contrário da viúva ela dá tudo o que ela possuía para viver. Ela dá o seu melhor. Nós estamos dando o nosso melhor? Como e quando? Não lhe sobra nada para viver com um pouco de dignidade.

É uma atitude de total confiança. Confiança na providência, em Javé libertador dos oprimidos. Ela não pensa. Ela não calcula. Ela simplesmente entrega suas moedinhas. Sem saber o que acontecerá mais tarde ou no dia seguinte. Marcos mostra que está mulher não está fissura pelo dinheiro, pelo poder, pela fama. Não vive aprisionada as suas migalhas.  É uma atitude de completo desapego. Jesus está edificado com o que ele vê. Seus olhos brilham com a bem-aventurança dos pobres. “Bem-aventurados os pobres no espírito, porque deles é o Reino dos Céus” (Mt 5, 3). Bem-aventurada a viuvez bem vivida na simplicidade e no despojamento.

 

Duas viúvas: pobreza e liberdade interior

 

A viúva do templo não é nomeada pelo evangelista. A nossa viúva chama-se Isabel que significa “casa de Deus ou “morada de Deus”. O que essas duas mulheres tem em comum? Muitas coisas. Muitos segredos. Porém, como sabemos Isabel não era pobre: “fez-se” pobre por amor ao Reino. Fez-se pobre para viver “com” e “como” os pobres a exemplo de seu mestre Francisco de Assis. Ela fez opção em ser pobre e pelos pobres. Opção radical que requer um constante desinstalar-se. Que requer um dinamismo interno e externo. A viúva Isabel fez exatamente o que a viúva do Templo fez. Ela colocou, destinou todos os seus trocados (moedas, dinheiro, bens) para o cuidado dos pobres e doentes do seu tempo. Isabel dá tudo. Entrega tudo. Bens, dinheiro, fama, luxo, prestígio, poder etc. Como distintivo de sua mais alta pobreza troca as roupas finas da corte por uma túnica cinza surrada e cingida por uma corda. A viúva da Hungria entrega aquilo que lhe é mais caro: a vida! Para ela a vida é dom para ser consumida como vela sobre o altar pelos mais pobres dos pobres. Entrega sua vida como oferenda, como oblação. Nesse ato heroico consagra todo o seu ser, toda a sua breve existência ao seu único amor: Jesus Cristo. Não retém nada de próprio para si. Tudo é de Deus e de seus prediletos: os pobres, doentes e leprosos que ela cuida em seu hospital.  De coração para coração o nosso fundador, Frei Luigi Quadrelli, OFM Cap, nos recorda algo precioso: “A pobreza é muito mais profunda, é o esvaziar-se de todo o nosso próprio ser para o triunfo do nosso único proprietário, porque a vida é Ele e é só Ele a razão de tudo”. E o Mestre da atenção plena nos diz: “Não vos preocupeis, pois, com o dia de amanhã: o dia de amanhã terá as suas preocupações próprias. A cada dia basta o seu cuidado” (Mt 6, 34).

Portanto, temos diante de nós duas mulheres. Duas vida. Duas viúvas pobres que tem em comum o desapego ao dinheiro, ao poder e aos bens materiais. Vivem com o coração indiviso para o seu único e eterno Absoluto.  São movidas por uma inabalável confiança no Deus da vida. O que Jesus diria para a nossa viúva Isabel da Hungria? Certamente não ele pouparia aquele mesmo elogio afetuoso e comovente feito a viúva do templo. Bem-aventuradas as viúvas que entregam tudo sem reservar nada mais para si. E esquecendo-se de si confiam plenamente naquele que jamais deixa faltar algo para os seus escolhidos e escolhidas.  Entrega tudo! Dá tudo e terás sempre mais.

 

Para refletir:

 

Como é a nossa relação com o dinheiro?

Como nós vivemos a nossa consagração batismal e religiosa com relação as coisas que possuímos?

Temos algum tipo de apego material, espiritual? Quais?

 

🌿 Irmão Eder Vasconcelos, Franciscano, nos convida a redescobrir a "Pedagogia do Silêncio" Um texto profundo que nos lembra que é no recolhimento que nos conectamos com Deus, conosco e com o próximo.

 


 
 
 

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