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Histórias da Vila do Povo Feliz (52) - Família Bernardon


Em meio ao movimento dos pioneiros, havia algo que os unia: a busca por novas oportunidades. As terras já não eram suficientes para comportar os numerosos clãs, e as áreas disponíveis para expansão eram escassas.

Enquanto algumas famílias se contentavam com suas reservas e um estilo de vida mais tradicional, outros traziam consigo o espírito aventureiro de seus antepassados, que deixaram a Itália no final do século XIX em busca de um futuro promissor nas Américas.Com sonhos de prosperidade e a vontade de oferecer melhores oportunidades às gerações futuras, esses visionários enfrentavam desafios com determinação. Mesmo em meio a uma cultura onde a educação não era prioridade, eles mantinham viva a chama da evolução econômica, inspirando seus filhos a trilharem seus próprios caminhos rumo ao sucesso.

O resultado final deste relato é uma mescla incrível de sabedoria e coragem, onde a força da tradição se encontra com a ousadia do empreendedorismo. Uma história inteligente e inspiradora, que nos mostra que é possível construir um futuro melhor com base nas lições do passado e na visão audaciosa do presente.

Neste enredo rico em tradições e cultura, a família protagonista pode muito bem ter laços de parentesco com Francisco de Assis, já que seu sobrenome era Bernardone.

Sabemos que muitos nomes italianos sofreram alterações na grafia durante registros cartoriais, mas este é um detalhe que não nos cabe aprofundar.

O que importa é que esta nobre família, descendente de italianos, tinha um grande clã em sua maioria composto por mulheres, que desempenharam um papel fundamental na construção da história da Vila do Povo Feliz.

Nos anos 60, vindos da região de Getúlio Vargas, essa família e outras vindas da mesma região chegaram a estas terras com o sonho de uma vida melhor.

Como não poderia deixar de ser, decidiram explorar a maior riqueza da região: os pinheirais e a madeira nativa da mata atlântica, que precisavam ser derrubadas para dar lugar a uma nova atividade ligada à agricultura.

Diante da realidade e com uma visão equilibrada e organizada, o patriarca, conhecido por sua caligrafia impecável e visual elegante, juntamente com seus irmãos e sócios, decidiu empreender em uma serraria na Linha Coxilha Negra.

Enquanto mantinha a família na Vila, permitindo que as crianças e adolescentes continuassem a estudar. Além da serraria, eles investiram em áreas de terras para futuras atividades pecuárias e agrícolas, como plantações de soja, milho e erva-mate.

O empreendimento foi um sucesso, tanto que um dos irmãos e sócios se tornou Prefeito de Palma Sola.

Infelizmente, nem tudo saiu como planejado, com a trágica morte de um dos sócios em um acidente com um caminhão de transporte de toras. Essa história já foi mencionada em outra narrativa das Histórias da Vila do Povo Feliz.

Com o passar dos anos, a sociedade se dispersou, cada um seguindo seu próprio caminho.

A exploração da madeira deu lugar à agricultura e à pecuária, com investimentos em máquinas como o MF-65 e uma picape amarela que me traz lembranças de 1979, ano em que o Internacional se consagrou campeão brasileiro.

Seu filho mais novo, um colorado apaixonado, desfilava com uma carroceria de lata da picape que fora substituída por uma de madeira, deixada perto do Posto Esso por anos, puxada pelo trator MF-65 com gremistas a bordo após a final contra o Vasco da Gama.

No final dos anos 60, o patriarca foi eleito vereador na esperança de representar a vila no legislativo de Salgado Filho. Em seguida, seu genro também teve sucesso nessa empreitada, uma história que ainda terei que contar.

Com a liderança política estabelecida, foram abertas as portas para a batalha por melhorias na infraestrutura da Vila. Surgiram projetos grandiosos, como a edificação de um clube, cujo terreno já estava garantido, porém, infelizmente, não se concretizou. No entanto, esse anseio se transformou na realização do CTG e na tão esperada chegada da eletricidade em 1977.

Na época de ouro da Vila, surgiu o CTG Sinuelo da Serra, representando o auge cultural e social do local.

Essa família desempenhou um papel crucial nesse contexto, como comprovam os registros históricos e o Estatuto Social da entidade, repletos de escritos do talentoso redator de atas.

Ao lado desse gentil senhor e do renomado Professor Oreste Rossetto, aprimorei minhas habilidades na redação de atas, tornando-me sucessor em diversas entidades ao longo dos anos.

Essa experiência foi crucial para moldar minha habilidade em relatar os fatos com precisão e emoção, tanto nas produções nostálgicas que compartilho em meu blog, no livro que lancei, quanto nos emocionantes projetos futuros que estão por vir.

As memórias do Patriarca ainda ecoam na minha mente, lembrando-me dos momentos em que, ainda jovem, me sentava ao seu lado no balcão do negócio da minha família, absorvendo suas sábias palavras com tranquilidade.

Ele personificava os valores da honra e da grandeza, sendo um exemplo de autoconhecimento e generosidade, deixando um legado admirável para todos que o conheciam.

Com relação aos filhos, naquela época tínhamos pouco contato, já que eram mais velhos do que eu. Lembro-me vividamente de um triste velório do primogênito nos anos 70, que deixou todos nós consternados.

Mesmo criança, acompanhei meu pai para prestar conforto à família. A luz da noite vinha de um lampião a gás, enquanto o jovem era velado na casa dos pais.

Uma lembrança doce que guardo com carinho é da minha professora favorita, filha desse casal. Ela lecionava ciências, após obter sua formação em Magistério no Rio Grande do Sul.

Foi uma presença marcante em minha vida escolar, e, na formatura do Ensino Médio, eu esperava ansiosamente que ela entregasse meu Certificado simbólico.

E assim foi, mesmo grávida e passando por um momento difícil, ela fez questão de me entregar o diploma. Logo após a formatura, seu pai faleceu, em um momento que coincidiu com a mudança da antiga igreja para a nova construção.

Após esse incrível encontro, tive o privilégio de me tornar colega de trabalho da minha professora favorita, que se tornou minha gestora no Colégio Padre Anchieta, em Salgado Filho.

Sem dúvidas, uma das melhores líderes que já presenciei em ação. Ela era dinâmica, sempre olhando para o futuro do processo educativo.

Hoje, vejo-a feliz, viajando com suas amigas e desfrutando da companhia dos seus netos. Assim como eu, ela está aproveitando uma aposentadoria repleta de realizações pessoais.

Durante o período de luto pela perda do patriarca, a maioria dos filhos já havia seguido seus próprios caminhos.

Foi então a responsabilidade de um dos filhos e das filhas que ainda moravam na vila de acompanhar a querida matriarca.

Com seu jeito italiano e cabelos brancos, ela continuou trilhando o caminho da fé por muitos anos, com um caminhar lento, porém decidido.

Recordo-me vividamente da pulseira de cobre que adornava seu pulso, ressaltando não apenas sua beleza exterior, mas também sua força e fé inabaláveis. Uma verdadeira mulher de fibra, com um brilho único que capturava a atenção de todos ao seu redor.

Após conquistarmos nossa independência como Vila, essa família revolucionária deixou sua marca ao impulsionar a expansão do campo de futebol local, moldando um novo capítulo em nossa história.

Foi através da generosa decisão de vender terras que esses cidadãos altruístas possibilitaram a construção da Unidade de Saúde Municipal, da Secretaria de Assistência Social, da Clínica da Mulher, do Ginásio Municipal e do Primeiro Conjunto Habitacional. A solidariedade demonstrada por eles foi fundamental para o progresso e aprimoramento da nossa comunidade.

Durante o meu primeiro mandato como Prefeito, tive a honra de adquirir a propriedade que um dia foi dos meus pais, de um dos membros dessa família, para iniciar a construção do Lago Municipal. Hoje, esse local se destaca como um ponto turístico imperdível em nossa cidade.

Essa visão progressista e empreendedora, sem dúvida, era herança do patriarca da família, que sempre enxergava além do horizonte em seus negócios. Mesmo após sua partida, tenho a certeza de que ele observa com orgulho o desenvolvimento e as conquistas que seus investimentos materiais proporcionaram à comunidade.

Esses monumentos históricos são testemunhas vivas da passagem do tempo, manifestando a relevância e o impacto que exerceram em diferentes épocas, seja na esfera religiosa da Igreja, na tradição gaúcha do CTG ou no cenário esportivo e cultural como um todo na Vila.

Foi com determinação e paixão que ajudaram a fundar o galpão crioulo, tornando-se uma referência cultural em nossa comunidade.

O filho, inspirado pelas tradições, emulou o papel de Patrão por diversas ocasiões, brindando-nos com a inesquecível performance do Programa Alô Tchê de Ivan Taborda e deixando sua marca na cena musical com um grupo batizado em honra ao CTG.

Por meio de suas apresentações em todo o Brasil, contribuiu para a disseminação da cultura gaúcha, entoando clássicos como "Bico de Teta, Ronco do bugio, ...", tornando-se um conjunto de renome no cenário gauchesco.

Com o passar dos anos, algumas das filhas voltaram à vila e se uniram para cuidar da querida mãe. Era emocionante testemunhar o carinho dessas mulheres durante a época natalina, ao decorarem a casa em homenagem ao Menino Jesus.

Mesmo que a maioria dos filhos tivesse seguido caminhos diferentes da fé católica, eles entendiam a importância de respeitar a crença de sua mãe, mesmo quando ela já estava avançada em idade.

A fé sempre foi um pilar fundamental nessa família, ajudando-os a encarar as adversidades da vida, como as perdas precoces de entes queridos, não como castigos divinos, mas como parte do tempo que cada um tem neste mundo para fazer o seu melhor.

Eles acreditam que a vida terrena era apenas uma passagem para algo maior e mais grandioso, algo que só poderia ser compreendido por aqueles que buscam a unicidade com o ser supremo em seus corações.

Agradeço de coração pelos valiosos conselhos recebidos do patriarca e da minha querida professora, assim como pela parceria do talentoso músico e esportista que, durante meu segundo mandato como Secretário de Esporte e Cultura, não apenas promoveu competições esportivas, mas também ajudou a resgatar nossa história.

Hoje, tenho o prazer de registrar aos poucos essas memórias, marcando no tempo e no espaço o que verdadeiramente faz a diferença - o legado.

Não se trata apenas de obras materiais, mas sim da construção feita com amor, muitas vezes silenciosamente.

Mesmo sem ter um impacto visual evidente, essa construção ressoa no interior daqueles que enxergam a realidade com clareza, compreendendo que nossas ações são fruto do talento divino concedido a nós.

É esse talento colocado a serviço que se transforma em um legado duradouro, mesmo que para muitos isso possa parecer uma ilusão.

Conhecer requer mais do que simplesmente receber informação - é necessário buscar o conhecimento através da leitura e da compreensão profunda dos acontecimentos.

Agradeço imensamente a essa família querida por ter feito história, mesmo que minha memória às vezes seja imprecisa, pois acredito firmemente que tudo o que colhemos hoje é fruto do que um dia tivemos a coragem de semear.


Um Sonhador Caminhando com Francisco - Escritor do blog https://www.caminhandocomfrancisco.com/

 

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1 Comment

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Guest
Sep 19
Rated 5 out of 5 stars.

Que linda e emocionante a história dos meu avós, da minha família. Escrito com tanta delicadeza e perfeição.

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