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HISTÓRIAS DA VILA DO POVO FELIZ (32) - FAMÍLIA ROSSETTO


Era tradicional nas numerosas famílias italianas, a consagração de um filho (a) a vida religiosa, uma forma de contribuir com Deus e a comunidade por meio daquilo que mais identificava essas famílias que era a sua fé, de outra forma era uma maneira de permitir que pelo menos um dos filhos (as) tivessem acesso aos estudos.

O trabalho na agricultura era árduo, e nem todos os filhos conseguiam aguentar o ritmo do trabalho, que iniciava na tenra idade de 6 a 7 anos de idade, período que tinham, que caminhar longe em grupos normalmente da mesma família (irmãos e primos) até a primeira escola primária, que funcionava no sistema multisserriada, com um professor (a) que se multiplicava em 4 para atender todos os alunos das 4 turmas do Ensino Fundamental inicial, normalmente o professor (a), tinha diversos talentos além de ensinar, dominava o canto, o esporte e tinha funções religiosas na comunidade.

Sendo o professor juntamente com o Padre que vinha mensalmente para rezar uma missa as principais referências da comunidade, embora o salário fosse pouco, mas a sua dedicação não era menor, pois era o centro e o respeito das comunidades, o saber era pouco, mas aprimorado com leituras e estudos adicionais para levar o mínimo aos alunos, já que o essencial era dominar as quatro operações, ler e escrever, fato que com o tempo pós saídos das escolas muitos se tornavam analfabetos funcionais, já que utilizavam o aprendizado apenas para escrever o nome, já outros buscavam dar continuidade aos estudos, porém era algo quase que impossível, mas que na narrativa que vos apresento, o ilustre aluno, se tornou professor.

Essa história tem início na região de Videira Santa Catarina, o próprio nome remete a pensarmos como era vida dessa família onde nasce o personagem da história, como a região era formada por pequenas propriedades de agricultores que migraram do Rio Grande do Sul, em busca de condições melhores para suas famílias, tendo a atividade principal o cultivo da videira, planta bíblica e de grande simbologia nas famílias de ascendência italiana, é nesse ambiente que nasce um menino, cheio de vitalidade, com habilidades para o esporte e o talento para cantar e estudar.

Claro que isso já era um motivo de orgulho para os familiares, mas com o incentivo do Padre que vinha a comunidade e com apoio dos patriarcas ele se aventurou rumo ao sacerdócio, imaginava que seria um padre, já que tinha facilidade para aprender, boa oratória e boa escrita.

Porém o destino não quis que seguisse esse caminho, optando pela área de contabilidade, já no Ensino Médio, naquele tempo o exercício dessa atividade se dava diretamente nas empresas e foi aí que surge uma oportunidade, após casar-se com a filha de uma família de italianos da comunidade, cujo o irmão mais velho havia se embrenhado para uma região próxima da fronteira com a Argentina para administrar uma área de terras de seus tios e iniciar a atividade de serraria e fábrica de papel.

Essa era a oportunidade que o jovem casal esperava, e com muito entusiasmo enfrentaram as estradas precárias e chegaram a Vila do Povo Feliz, no início dos anos 60, quando fervilhava diversas atividades (Posto de combustível, hotéis, comércios...), se colocaram em uma casa da Madeireira e iniciou o trabalho de controle administrativo, fiscal e financeiro da empresa que prosperava, ampliando as atividades produtivas com o cultivo da erva mate, da bovinocultura de corte e a preparação das áreas para o cultivo de grãos.

Foi um período de muita doação ante as dificuldades de adaptação e as provações daquele período, mas isso não desanimava o casal, que com a vinda dos filhos ia encontrando alegria para a vida seguir.

Desde de sua chegada, o esporte local que tinha o Botafogo, começando recebeu um reforço de excelência, por muitos até hoje considerado um dos melhores jogadores que vestiu a camisa do glorioso, atuava na ponta direita, tinha um drible fácil estilo garrincha e uma elegância ao conduzir a bola e uma capacidade única de colocar os companheiros na cara do gol.

Além do futebol, ele se aventurou no mundo da política, sendo Vereador no recém criado Município de Palma Sola, período em que o exercício da vereança era um ato voluntarioso, pois não recebiam subsídios para o exercício da função, nessa empreitada, colaborou para instalação da Escola Municipal Paulo Macarini, que funcionava próximo ao campo de futebol, com o auxílio do cunhado que já era uma liderança de destaque e que foi eleito Prefeito da cidade.

A criação dessa escola, foi determinante para que iniciasse o Ensino Fundamental II (5ª a 8ª série), por um período até que se criasse o atual Colégio Barão do Rio Branco, ele foi um dos professores que encarrou o desafio de atuar no magistério, mesmo sendo sua formação na área técnica aceitou a incumbência de atuar nessa nobre área, o que levou-a a posteriormente aprimorar os estudos para continuar na atividade.

Tive o privilégio de tê-lo como professor e Diretor em todo o meu ensino Fundamental II e Ensino Médio em diferentes disciplinas, Ciências, Língua Portuguesa e Contabilidade e posteriormente como colega no início de minha carreira no ano de 1986.

Não tenho dúvidas que foi um dos grandes professores que tive, de grande conhecimento e com muita habilidade para manter a gestão de sala de aula, é inesquecível as suas aulas de português, onde trabalhava a etimologia (origem das palavras), com seu sotaque italianado era inconfundível a expressão latim com um (i), bem espichado.

Sua atuação também se deu no campo cultural, sendo um dos fundadores e o 2º Patrão do CTG Sinuelo da Serra, ele cultuava a cultura gaúcha não somente na pilcha, mas com conhecimento da história e do legado da povoação gaúcha que se estendeu pela região dos pampas e que chegou até nós graças a pessoas como ele e outras já relatados nas Histórias da vila do Povo Feliz.

O seu amor ao esporte também se estende ao aspecto cultural, pois possuía em seu escritório, todo o memorial de troféus conquistados pelo Botafogo, guardados com esmero, para lembrar as gerações futuras, as conquistas gloriosas de torneios e campeonatos que sempre eram premiados com troféus com uma estética em forma de copo, destacando a copa que havia sido ganha pela equipe.

Este renomado professor também se destacava por sua habilidade em organizar documentos de entidades, como estatutos, dominando todos os processos e possuindo uma incrível facilidade em resumir informações.

Ele era o mestre na redação de atas de reuniões de entidades da época, e foi por seguir seus passos que me tornei seu sucessor nesse aspecto nos anos 90.

Na função de Secretário da Comissão de Emancipação, fui encarregado de documentar minuciosamente todas as reuniões que conduziram ao momento crucial da emancipação.

Além disso, tive o privilégio de coordenar o processo eleitoral dos diretores da escola e redigir o Estatuto do Sindicato dos Trabalhadores Rurais, entre outras atribuições.

Essa colaboração simbiótica com um líder visionário não só me inspirou, mas também influenciou profundamente minha maneira de agir e de pensar.

Com o passar dos anos e a redução da atividade madeireira e a mudança do rumo das atividades da empresa em que trabalhava, começou a se dedicar a algumas atividades agrícolas, inclusive adquiriu a propriedade, de uma família que já narrei a história e que hoje reside no Mato Grosso, que deixou uma mata de pinheiro praticamente dentro da cidade.

Também associou-se com outro professor em um Escritório de Contabilidade onde sua filha atuava meio período, já que também seguiu os caminhos do pai nessa atividade e no Magistério, enquanto ele continuava a fazer a contabilidade da empresa e dava meio período de aulas, e em muitos desses períodos exercendo a função de Diretor.

Com a criação do Município, atuamos juntos na criação do Ensino Médio, ação que eu e minha esposa a frente da Secretaria Municipal de Educação empreendemos como chave, já que até a emancipação os alunos se dirigiam a outros Municípios para estudarem, ele foi um entusiasta da ideia e ajudou a confirmar o pleito que nos engajamos.

Juntos caminhamos até o ano de 1996, quando o destino nos separou: eu assumi o comando da prefeitura e ele decidiu se aposentar. Infelizmente, logo após merecido descanso, ele nos deixou, deixando um vazio em nossos corações.

Sua ausência foi sentida não só por mim, mas por todos os companheiros daquele barzinho e do CTG, onde ele adorava se sentar e compartilhar suas histórias, regadas a goles e olhares penetrantes.

Seu jeito italiano pragmático, que falava mais com os olhos e gestos do que com palavras, encantava a todos com seus contos, piadas e até mesmo canções italianas.

E ao entardecer, ele partia para casa em seu corcel bordô impecável, um tesouro adquirido novo e com pouca quilometragem. Sua partida deixou saudade, mas suas memórias permanecem vivas em nossos corações.

Já sua esposa de uma família tradicional, seguiu sua caminhada terrena por mais um período, sempre com um largo sorriso e zelando por sua capelinha de Nossa Senhora Aparecida que visitava as casas das famílias, sendo uma das precursoras dessa tradição religiosa italiana na Vila, que remete a Itália e aos antepassados desses familiares.

Seu legado está marcado para todo o sempre, pois aqueles que escrevem suas histórias com marcas jamais se apagam, esse professor e intelectual, fez do conhecimento algo sublime, pois transferiu a muitos alunos, bem como a seus filhos, que seguiram seus passos.

Sendo uma professora, minha colega de escola e do PDE, outro engenheiro civil, meu aluno do 3º ano do ensino médio, colega de minha irmã mais velha, com certeza foi um orgulho para os pais tê-lo no final década de 80 e início de 90, alguém formado nessa área, bem como para mim e para toda comunidade que torcia pelo seu êxito.

Já sua filha mais nova é hoje funcionária da APAE, onde também segue os passos dos pais, doando-se em favor dessa nobre causa dos apaeanos.

Quanto ao filho mais novo, mesmo formado em Direito, escolheu iniciar sua jornada na agricultura, transformando as áreas herdadas em empreendimentos imobiliários que contribuem para expansão da cidade, uma vez que essas áreas estão conectadas ao projeto original da cidade.

Guardar na memória o querido colega e ilustre mestre, a quem tive o privilégio de nomear a Biblioteca Municipal em sua honra. Essa escolha simbólica, que reflete sua paixão pela leitura, ocorreu durante meu segundo mandato como Prefeito.

O edifício, estrategicamente localizado em frente à casa dele, foi construído durante meu primeiro período de Prefeito e tornou-se o ícone arquitetônico mais marcante e duradouro da nossa cidade.

Infelizmente o acervo foi removido e hoje funciona outras atividades, algo incompreensível para mim que dediquei-me a ver esse vulto ser erguido e fomentado com o Projeto Agentes de Leitura, mas essa uma questão que está em outra esfera e diz respeito as prioridades de cada gestor como administrador, cabendo ao povo que elege decidir se concorda ou não, a mim como criador resta a decepção e o pensamento do que mais poderia ter feito para tornar esse símbolo ainda mais grandioso e acessível.

Como aluno, colega e admirador, só posso expressar minha sincera gratidão e enviar minhas preces para que ele encontre paz em sua jornada espiritual, onde certamente descansará eternamente em tranquilidade.


Um Sonhador Caminhando com Francisco - Escritor do blog https://www.caminhandocomfrancisco.com/

 

4 comentários

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Guest
Jul 05
Rated 5 out of 5 stars.

Que história bonita sobre nossa cidade, sempre tive este prédio que fica ao centro da cidade um grande apreço e sabendo a história da nossa antiga biblioteca e mais lindo ainda,e uma pena que não funciona mais lá a nossa biblioteca.

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Guest
Apr 25
Rated 5 out of 5 stars.

Temos muitas histórias de vida que formaram essa vila feliz ! Uma delas minha família contribuiu cheia de vontade de fazer o melhor ! Continue contando pra nós e nos lembrando de cada uma !

Sinto pela perda da biblioteca ! Livros sempre foram o forte para conhecimento .Meu pai sempre gostou de muitos livros .

Ao lado da mãe fizeram seu papel aqui nessa vida !

Brilhante trabalho Paulo ! Continue .

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Guest
Apr 25
Rated 5 out of 5 stars.

Gratidão

Parabéns professor Paulo, por ter essa brilhante iniciativa de contar poeticamente as lembranças de nossos antepassados. Meu pai deve estar feliz lá no céu.

A neta dele Isadora ao ler seu texto, mencionou: " quanta coisa que eu não tinha conhecimento sobre meu vô!"


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É gratificante tocar a alma dessa jovem, incentivando-a a explorar mais sobre sua encantadora família. Essa história merece ser preservada de maneira fluída, destacando suas realizações e mostrando que, apesar dos obstáculos da vida, sempre há algo positivo a ser encontrado! Cada indivíduo, em sua simplicidade, desempenha um papel crucial no progresso da comunidade. Que todos sejam abençoados...


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